Algo novo, de novo
Eu tentei, sobretudo, não atender às minhas expectativas sobre o que uma noite poderia ser antes de tornar à luz da manhã. Mas a madrugada que nos mantinha os olhos abertos trazia mais que um novo dia, como o show das luzes e dos fogos explicitavam, ao colorir as desertas ruas da vizinhança. As pessoas abdicavam da nitidez de suas retinas e admiravam o céu por trás de visores com alguns milhares de píxeis, enquanto preenchiam suas redes sociais com a alegria e esperança que faltavam-lhes em seus dias mórbidos. Há algo que adjetivam como social que individualiza as pessoas em seus próprios mundos de bolso e tiram-lhes a voz, entregando-os o texto, assim como tiram-lhes a sensação, e os entregam a imagem. Nós estávamos além do domo sendo observados apenas por meia dúzia de pessoas e a luz singular do primeiro luar do ano. Para um bêbado em fim de madrugada, não é necessário mais do que estar acordado para achar engraçado até a falta de firmeza ao tentar se equilibrar sobre as duas pernas, contudo, não era o nível de álcool em meu corpo que me fizera sorrir a todo momento com a boca, os olhos e a alma. Há uma linha tênue entre risadas e sorrisos; e foi ultrapassando esse pequeno e frágil limite que pude sentir algo mais em nossa conexão. E, com certeza, houve menos romantismo que quaisquer dos encontros que já tive. Mas a completude sentida naqueles momentos mostrou-me que a realidade, caro amigo, é, ainda que mais dolorosa, também mais intensa que a fantasia. Não dá para descrever nem um minuto sequer daquela noite com os clichês de prosas românticas e poesias pós-modernas. Porque o que exalávamos molhados gritando pela rua quando o sol timidamente aparecia no céu, não era a paixão que ascende fácil como fogo mas se apaga com o vento; mas sim, a cumplicidade e prosperidade que se construíram de forma sólida e inconsciente ao longo dos meses. Em nenhum momento eu quis, ou quero, romantizar aquelas horas de sintonia e acabar por torná-la voláteis como casos de contos onde amor é algo cultivado pela emoção disjunta da razão, porque aquilo que me fazia voltar para casa dançando e sorrindo para as ruas desertas certamente era um dos sentimentos mais lúcidos e racionais que eu já tive. Caminhamos pelas ruas desertas enquanto cantávamos e víamos as nuvens densas abrirem espaço para a luz da manhã. Tudo estava em seu devido lugar. Éramos uma nova perspectiva observando um novo dia ascender num novo ano. Tudo era novo. E, novamente, eu sentia mais do que demonstrava. Mas era algo novo, de novo.
Terça-feira, 2 de janeiro de 2018
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